A realização da oficina “Características de alguns sistemas de saúde quanto à universalidade e equidade no acesso” e o relatório produzido a partir dela “Comparação entre Sistemas de Serviços de Saúde da Europa e o SUS: pontos para reflexão da agenda da Atenção Básica” procuram comparar as realidades dos sistemas públicos de saúde europeus e o SUS.
Além de Sílvio Fernandes da Silva, ex-Secretário Municipal de Londrina (PR) e ex-presidente do CONASEMS, a oficina, realizada durante o XXIV Congresso Nacional de Secretários Municipais de Saúde, realizado pelo CONASEMS, no Pará, teve como palestrantes as professoras e pesquisadoras Lígia Giovanella, da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (ENSP/Fiocruz) e Eleonor Minho Conill, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Oficina e Comparação
Os objetivos da Oficina foram compreender e comparar sistemas públicos de saúde com acesso universal, com ênfase em parâmetros assistenciais de oferta e utilização de serviços, organização do modelo de atenção à saúde e formas de financiamento.
Para a elaboração do relatório foram colhidas informações das apresentações das palestrantes, de documentos distribuídos, dos debates entre os participantes e de dados coletados em órgãos de pesquisa.
A comparação feita entre sistemas europeus e o SUS, apesar das diferenças sócio-econômicas, históricas e culturais dos países europeus e o Brasil, foi feita porque algumas variáveis são mais fáceis de serem comparadas entre países que têm acesso universal aos sistemas de saúde. O Brasil é um dos poucos países do continente americano com essa característica. “A comparação do SUS com os sistemas europeus é muito útil como ponto de reflexão. Eles têm uma história de décadas de construção de sistemas universais”, afirma Sílvio Fernandes da Silva.
Resultados
De acordo com o estudo, é possível perceber, na Atenção Básica, comparando os sistemas europeus e o SUS, uma grande diferença na organização e na gestão do cuidado da saúde. Na Europa, há maior preocupação em organizar o cuidado da atenção por vinculação do médico com usuários previamente registrados. O gerenciamento do cuidado é geralmente feito com a participação deste profissional. A Atenção Básica procura assumir a demanda da atenção à saúde no seu nível de competência, condicionando o acesso ao especialista. Para isso, há investimentos na formação do generalista, a forma de remuneração é vinculada à produtividade e à obtenção de melhores resultados, sendo possível atender a demanda e realizar atividades de prevenção e promoção da saúde no nível básico de atenção.
Entre os resultados da oficina, destaca-se que, na Atenção Básica, os países europeus têm mais médicos por habitante do que no Brasil. Além disso, há maior produção de consultas médicas nas áreas básica e especializada. A proporção de médicos generalistas na Europa é bem superior à média brasileira. No SUS, a adscrição de usuários por médico é de 3.500 a 4.500 pacientes, bem superior à média encontrada nos países europeus, de 1.030 a 2.500 pacientes, e a remuneração dos médicos, mesmo nos países com menor faixa salarial, é maior do que a praticada no SUS. No SUS, ainda há grande rotatividade de profissionais que atuam na Atenção Básica.
A cobertura assistencial pública nos países europeus chega a quase 100%, enquanto que, no Brasil, o sistema público cobre 75%. As taxas de internação e o número de leitos por habitante também são bem superiores. A porcentagem dos gastos públicos em relação aos gastos totais também é bem maior na Europa do que no Brasil.
“Na Europa, proporcionalmente, há mais médicos na Atenção Básica que no Brasil e, além disso, há mais generalistas. Este é um desafio que precisamos enfrentar. Para isso, são necessárias políticas que incentivem o aumento do número de médicos generalistas no Brasil”, explica Silva.
Ponto positivo
Para o ex-presidente do CONASEMS, um ponto positivo é que o SUS dá ênfase ao multiprofissionalismo. “Na Europa, os sistemas são organizados tendo o médico como figura central. Já no SUS, o papel dos enfermeiros, odontólogos, assistentes sociais, fisioterapeutas e outros profissionais da saúde é muito importante na organização do serviço de saúde, e isso é um avanço”, salienta.
O modelo almejado no SUS não é médico-centrado. Tanto na Saúde da Família quanto nas UBS tradicionais, preconiza-se o trabalho multiprofissional e interdisciplinar, na perspectiva da integralidade e equidade na atenção. Na prática, porém, há um conflito entre o que se pretende e o que efetivamente acontece. No SUS, o modelo tende a ser médico-centrado devido à hegemonização na cultura das organizações de saúde e da própria população. Há dificuldade em organizar o trabalho em equipe multiprofissional no SUS, pois não há consolidação do modelo de atenção que integre a clínica com as outras ações de saúde, na perspectiva da integralidade da atenção. Além disso, há oferta insuficiente de médicos, sobretudo para exercer a função de generalista e gerenciador do cuidado.
quarta-feira, 24 de setembro de 2008
Sistemas europeus de saúde e o SUS
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